Blog
O que eu precisava aprender com o Alzheimer? – Papo de Cuidador
- 18 de julho de 2019
- Posted by: Alzheimer360
- Category: Cuidador
Quem é esse homem que me olha com raiva e estranhamento?
Quem é essa mulher que me diz coisas que humilham e ferem gratuitamente?
Quem são essas pessoas que me pedem o tempo todo, para voltar para casa para matar a saudade do filho querido?
De quem é esse olhar que não me reconhece?
A quem pertencem esses braços que não me acolhem, nem me oferecem uma migalha de amor, ou gratidão?
Para onde foram meu pai e minha mãe?
Porque essas pessoas que tomaram conta do corpo deles, não conseguem me amar, ou pelo menos aceitar meus cuidados com um pouco de afeto?
O que essas pessoas têm para me ensinar?
Quem teria a ousadia de se apossar dos corpos do meu pai e minha mãe, para me ensinar alguma coisa?
Arrogância minha, acreditar que todo o sofrimento que meus pais passaram foi apenas para me ensinar algo?
Acreditar que tudo tem um propósito maior que eu, seria apenas uma maneira de maquiar todo medo e sofrimento, que o Alzheimer trouxe para minha vida?
Que lição tão importante escolheria um mestre tão assustador, em um corpo tão amado?
Acho que eles estavam tentando me ensinar alguma coisa, sobre o amor e a compaixão.
Talvez alguma coisa sobre a minha carência, que insiste em criar expectativas.
Ou quem sabe, tentaram me ensinar que amor não é moeda de troca.
Enquanto eu tentava dar mais uma colherada de sopa, na boca da minha mãe, ela dizia que não gostava de mim e não queria comer aquela porcaria.
O que eu fazia com isso?
Guardava no meu coração e chorava na cozinha, tentando entender porque aquela mulher não me amava mais. O que eu não entendia era que a minha mãe não estava mais naquele corpo, e o “cedeu gentilmente”, para alguém que precisava desconstruir minhas definições de amor. Mamãe não teria coragem de me ensinar de um jeito tão cruel e realista.
Tento fazer meu pai tomar o suco com o remédio, e ele me olha irado – “eu sei quem você é e eu nunca fui com a sua cara. Não vou tomar essa merda porque você não manda em mim.”
Naquele momento eu entendi que a compaixão não pode depender do amor pessoal e egoísta – “eu também não vou com a sua cara, mas o senhor vai tomar esse remédio, ou eu chamo a policia. Não pense que vou te obedecer.”
E nesse discurso irado, eu descobri que a compaixão e o amor estavam sustentando cada palavra.
Como uma mãe que enfia a colher com remédio goela abaixo, do filho que chora e grita; eu precisava aprender a segurar o fio da vida dos meus pais, ainda que eles desafiassem meu amor e carência todo o tempo.
É isso que o Alzheimer veio me ensinar?
Que não preciso fazer declarações de amor para mostrar amor; basta um gesto de compaixão e olhar o outro com os olhos dele.
Que não preciso esperar um olhar de gratidão, porque a gratidão e o amor estão embutidos no meu gesto, e não na forma como eles recebem esse amor.
O que mais eu aprendi?
Ainda não sei, mas acho que tem muito mais coisa para entender e somar a essa nova mulher, que sinto nascer no lugar da Mirinha do seu Rubens e da dona Nena.
Míriam Morata, autora de Alzheimer diário do esquecimento e Alzheimer recolhendo os pedaços
Loja virtual https://alzheimer.loja2.com.br/
Hoje precisei, chorando, ser firme com minha mãe. Debilitada, após 30 dias acamada, começou dar uns passos vacilantes, queria lavar louças, lavar um pano, em pé na cozinha me dando broncas, dizendo q estava sendo muito maltratada e q meu pai, ñ a defendia, fez ele chorar. É o corpo da minha mãe, mas ñ é ela. Está c demência, ñ confirmado Alzheimer. Cérebro atrofiado.
Nunca esqueça isso, não é sua mãe que está falando é o Alzheimer
Para mim, definir alzheimer. …
“perder uma pessoa em vida “😢😢